30/12/2007

Sobre água da chuva

Nesse dia o sol castigava como sempre castiga em dias como estes. Sai em busca de sorrisos. Acho que não encontrei nenhum, mas isso não me deixou triste. Pelo contrário, sereno. Sem nenhum motivo especial me senti sufocado por uma paz fora de hora, que me deu a mão e me impediu de mergulhar no oceano sozinho e sem bóia. O brilho do dia parecia que ia me cegar a qualquer momento. Já não podia abrir os olhos sem franzi-los e deixá-lo todo enrugado, como se eu fosse um velho. Não sou tão velho assim, mas já é possível perceber a marca do tempo. Eu sinto. Já tinha desistido de encontrar algum sorriso naquele dia quando a água me surpreendeu. Era a água da chuva. Estranhamente eu não me aborreci. Não praguejei nem ao menos lembrei do característico azar que cisma em me fazer companhia. Quando me toquei já estava lá, no meio daquela água toda caminhando lentamente. Meu destino parecia cada vez mais longe e se pudesse entraria na rua errada só para sentir mais um pouco o prazer da chuva encontrando meu corpo. Sem explicação, sem preparação, sem avisar ou mandar telegrama, que pode ser um trovão daqueles que fazem a perna tremer, a chuva chegou. E lavou-me dos pés a cabeça, se me perdoarem o lugar-comum. Ao chegar em casa estava limpo. A blusa grudada no corpo. O cabelo desarrumado pingava. E nesse dia me senti leve. Ao chegar em casa tirei a blusa molhada, mas não me enxuguei. Continuei sem entender nada por um bom tempo. Também não busquei explicações. Sentia-me em paz e isso é o que importa.

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