Não queria sentir isso, ansiedade que me faz ficar acordado, ardendo em febre, morrendo cada dia um pouco, lentamente, como deve ser aproveitada toda dor que nos fere. Não é fácil ter vinte e poucos e toda a responsabilidade de uma vida pela frente. Ainda não se é adulto o suficiente para enfrentar tudo (pelo menos eu não sou) nem jovem o bastante para não assumir nenhuma responsabilidade. É a obrigação que mata, de ter sucesso, ter a vida que todos esperam que eu tenha, e não quero ser como todos vocês, por isso o suor nessa noite fria, onde apenas a lua testemunha minha angústia. Já me disseram: the movement you need is on your shoulder. Será mesmo?
Para fugir desse mundo recorri a antiga arma, que sempre me salva e me tira dessa lógica onde a ausência de tempo dá o tom dos dias.
O mais pesado fardo nos esmaga, nos faz dobrar sob ele, nos esmaga contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos, porém, a mulher deseja receber o peso do corpo masculino. O fardo mais pesado é, portanto, ao mesmo tempo a imagem da mais intensa realização vital. Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira.
Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semi-real, que seus movimentos sejam tão livres quanto insignificantes.
Então, o que escolher? O peso ou a leveza?
Milan Kundera - A insustentável leveza do ser
Nenhum comentário:
Postar um comentário